Seguidores

terça-feira, 27 de junho de 2017

As migas de alho

De seitouras em punho, bem firmes,  aos poucos e compassados, o rancho abria caminho pela seara imensa. Havia que aproveitar o fresco da madrugada... 



Iam ao raiar do sol, digamos que de madrugada pois a partir das dez, ninguém aguentaria, nem o gado, a não ser eles nas ceifas habituados; o estômago vinha tratado a preceito com o melhor que a casa tinha ao dispôr, desde a adega, e arca salgadeira, acompanhado pelo pão de ceveira (metade milho, metade centeio, mas ruim de estender...).
E a coisa lá ia indo com o calor a apertar mesmo tão cedo sendo, mas aquelas gargantas soltavam cantigas tão belas em desgarrada, que nem o suor apagava as notas.
Logo iriam aparecer os canastros recheados para a "piqueta", carregados na rodilha sobre a cabeça pela serra acima com o melhor queijo e presunto, sardinha frita, sei lá, tanta coisa acompanhada por sêmeas da tia Esperança (era o pão feito do farelo fininho do trigo que por norma era o da terceira peneira) e depois tudo girava com afoito, pois estas gentes vinham por amizade retribuir os favores de uns e outros.
O momento mais aguardado, além do descanso, era o almoço como se dizia e aqui entram as migas de alho obrigatórias!
Há quem diga que as migas são a parente pobre da açorda, depende da sua riqueza!
O preparo, é basicamente idêntico, partindo da base que é o refogado, a cebola, alho e azeite, mas onde reside o segredo?
No genuíno pão de centeio caseiro...o mesmo que para tal anda este rancho na ceifa.
Partiam o pão centeio duro para um alguidar e ficava com água a amolecer.
Ia o bacalhau a cozer, água da cozedura guardada e este depois desfiado, ia parar ao tacho no refogado com muito alho e o pão pouco aguado e salpicado com salsa.
Quem queria/podia, deitava por cima ovos batidos e deixava ferver um bocadinho, quando não, só a gema, sempre a mexer e deixar pategar (ferver) um bocadinho.
Na falta do bacalhau para quem tal não podia, misturavam o feijão verde cozido da horta e tudo sabia bem...
Tudo servia para o almoço e mais tarde e por costume, para a merenda eram acrescentados os chicharros chícharos cozidos.
Belos tempos estes...

domingo, 18 de junho de 2017

Predicados

Na vida social de uma aldeia como Forninhos havia há 50 anos palavras e expressões com um significado que ainda hoje têm o mesmo valor. Exemplo, as palavras "doutor" e "professor". 
Mesmo que não tivessem concluído uma qualquer licenciatura os "doutores e professores" eram boas pessoas, boa gente e isso valia-lhes o respeito da população. Já diz o povo "mais vale cair em graça do que ser engraçada"
Sei que me entendem.
O exemplo do contrário, era judeu ou guinário. De cada vez que se queria dizer que fulano e sicrano era mau, bastava dizer:
- Aquilo é um Judeu!
E estava tudo dito. Pessoa que assim fosse rotulada estava marcada.
Mas para dizer que uma pessoa era mesmo muito má para a mulher e filhos, em geral as grandes vítimas, dizia-se:
- Aquilo é um Rei Herodes!
Se queriam ofender:
- Guinário.
Virá certamente de "sanguinário" e era uma palavra muito usada na minha meninice em Forninhos para designar pessoa que tinha mau íntimo. 


Rei Herodes - Rei da Judeia

Outras palavras muito usadas eram candaugua e corrécio.
A palavra candaugua é formada pelos sons do que devia ser "cão de água" e significa(va) vadio, um corrécio, que gosta muito de vadiar e pouco de trabalhar.
Quando um rapaz vinha tarde para casa ouvia logo essa do candaugua.
- Ah, candaugua, isto é que são horas?
- Seu corrécio!
Mas o que é que este cão algarvio, que segundo se lê na wikipédia até foi muito trabalhador tem a ver com vadiagem?
Não sei. Não encontro a lógica.
Outra:
- Aquilo é que é um valdevino!
Quer dizer também que a pessoa é um vadio, um estroina, que frequentava tabernas...
A palavra monarca também se ouvia como ofensa. Era alguém rude e armado que gostava de mandar, dominar. No feminino significava mulher muito gorda.
Depois vieram os vocábulos introduzidos pela mistura emigrante.
Quem não se lembra daquela célebre mãe a gritar "Michel, tu vas tomber" (Miguel, vais cair) e como o filho caiu: "Ai o filho da p*** que caiu mesmo".
O calão emigrante ouvia-se (e ainda se ouve) nas casas dos primeiros emigrantes regressados. 
Logo chegados de férias, falavam sem cessar das folhas de peia (feuille de paie), que significava o recibo relativo ao salário; dos papiês (papiers), os documentos de legalização como emigrantes; das pubelas (poubelles), os caixotes do lixo. Além dos vocábulos, demos connosco também a saber de cor os departamentos através das matrículas dos carros. O 75 era Paris, 92 ou 94 era dos arredores, 68 Colmar....
Apesar de serem cá apelidados depreciativamente de "avecs", é preciso não esquecer que naquela triste e apagada época dos "senhores doutores" em que, se tanto havia um ou dois em cada aldeia, a emigração trouxe dinheiro e conforto e construiu-se com a vinda dos avecs um linguajar diferente e mais colorido.
Longe vão os tempos em que se inventaram palavras como "guinários".

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Estamos de férias

Nesta altura do ano, fim de Primavera às portas do Verão, ao passar pelos caminhos rurais vê-se com abundância silvas floridas, uma espécie invasora que tantas dores de cabeça dá aos lavradores, mas que têm flores muito belas, donde sairão as amoras silvestres.


Logo à frente vimos um ramalhete de São João (erva-do-caril)


E surpresa...nos pequenos pomares domésticos, 


começam já a surgir amoras de cor vermelha.


Tocados pelo sol, ainda vimos pêssegos do S.João


+ maçãs do S.Tiago que até já apetece trincar...


E depois há a promessa das castanhas, 
pois não tardam a aparecer os pequenos ouriços. 

-/-
Repartimos as férias pelo campo e pela praia, primeiro fomos uma semana para Forninhos. Um dia em casa...e nova viagem.
De amanhã a oito estaremos de volta, desculpem a ausência.